11 novembro, 2003

(então senta...)

Eu prometi um montão de coisas, falei com pessoas amigas, levei safanões de gente que me ama - sim, há pessoas que me amam! -, tentei induzir uma porção de outras coisas e fiz de um tudo. Até cara de paisagem eu fiz, creia você. Fiz de conta, em cima do meu palco, e encarnei, por dois ou três dias, uma personagem que não estava nem aí com os acontecimentos. Ontem, não poderia deixar de ser, deu um 'bum' de saudades palpáveis, que tinham forma física, e me seguiram o dia todo... Optei por mais uma vez encarar a dor, que não é mais tanta dor assim, porém é um sabor de fracasso, e eu não sei lidar muito bem com essas coisas... Eu sei de tudo: que vai passar, que o tempo cura, que é preciso paciência, que isso, que aquilo. EU SEI. Só me permiti sentir a ausência novamente, que me é enorme, a falta, que me é gigantesca, o amor ainda muito presente e a vontade de que estivesse realmente tudo bem.... e isso não dá pra associar, então se sofre... se chora, é claro... mas concordo: passa. E estou esperando passar, acredite.

Hoje eu fui no Ponto Gemini, onde a Cacau faz uma referência à Martha Medeiros, que putz... ela é sem palavras. E foi nela que encontrei a explicação que eu tô atrás e não consigo dar.... se ainda não cansou da leitura, abaixo está um texto dela, da Martha, que é uma lição para tempos como os meus:

TIRE-O DA CABEÇA
14 de setembro de 1998

Você estava apaixonado por alguém e levou um fora. Acontece mais do que acidente de avião, desastre com romeiros e incêndio na floresta. Corações partidos é o grande drama nacional. O que fazer? Ainda não lançaram um manual de auto-ajuda que consiga eliminar nossa fossa, e dos amigos só podemos esperar uma frase, repetida à exaustão: tire esse cara da cabeça. Parece fácil. Mas alguém aí me diga: como é que se tira alguém de um lugar tão cheio de mistérios?

Gostar de alguém é função do coração, mas esquecer, não. É tarefa da nossa cabecinha, que aliás é nossa em termos: tem alguma coisa lá dentro que age por conta própria, sem dar satisfação. Quem dera um esforço de conscientização resolvesse o assunto: não gosto mais dele, não quero mais saber daquele prepotente, desapareça, um, dois e já!

Parece que funcionou. Você sai na rua para testar. Sim, você conseguiu: olhou vitrines, comeu um sorvete e folheou duas revistas sem derramar uma única lágrima. Até que começa a tocar uma música no rádio e desanda a maionese. Você não tirou coisa alguma da cabeça, ele ainda está lá, cantando baixinho pra você.

Táticas. Não ficar em casa relendo cartas e revendo fotos. Descole uma festa e produza-se para matar. Você bem que tenta, mas nada sai como o planejado. Os casais que se beijam ao seu lado são como socos no estômago. Você se sente uma retardada na pista de dança. Um carinha puxa papo com você e tudo o que ele diz é comparado com o que o seu ex diria, com o que o seu ex faria. Chamem o EccoSalva.

Livros. Um ótimo hábito, mas em vez de abstrair, você acha que tudo o que o escritor escreve é para você em particular, tudo tem semelhança com o que você está vivendo, mesmo que você esteja lendo sobre a erupção do Vesúvio que soterrou Pompéia.

Viajar. Quem vai na bagagem? Ele. Você fica olhando a paisagem pela janela do ônibus e só no que pensa é onde ele estará agora, sem notar que ele está ali mesmo, preso na sua mente.

Livrar-se de uma lembrança é um processo lento, impossível de programar. Ninguém consegue tirar alguém da cabeça na hora que quer, e às vezes a única solução é inverter o jogo: em vez de tentar não pensar na pessoa, esgotar a dor. Permitir-se recordar, chorar, ter saudade. Um dia a ferida cicatriza e você, de tão acostumada com ela, acaba por esquecê-la. Com fórceps é que a criatura não sai.

Martha Medeiros
Disse tudo...