07 abril, 2004

Passei um tempão hoje lendo meus arquivos... não sei definir se são pedaços de romance ou porções homeopáticas de meu diário... Quanto a fragmentos, dá idéia de material trazido da lua. As pedras e a poeira da lua estão intocadas, distantes, imutáveis, como é a minha fixação em certas circunstâncias! Encano que deus me livre! Repito, repito, até saturar, dar nas tampas.... Parece até comercial de televisão.

Teve um mês inteiro que dá uma minissérie. Qdo eu estiver mal das perna$, vou procurar as emissoras, pra ver se vendo... caramba, qto baixo astral. Faria multidões chorarem com Ana Paula Arósio no meu papel, olhando para o horizonte e sofrendo, sofrendo...

Tenho nas mãos uma história de amor, daquelas que o povo adoraria ver.... anda faltando história de amor por aí. Afirmação categórica de alguém que ama se apaixonar... Está mais do que na hora de me mancar e terminar com algumas encenações dentro de mim. Não faz sentido.

[monólogo]

...

Qualé, Polly? Tem história que já virou pó da lua, girando em outra órbita. Será que não aceita o fato de que o mundo não gira em torno de seu lindo umbigo? Não é essa Polly que eu admiro. Já é tempo de abandonar as feridas, porque ninguém mais tá dando a mínima, não percebeu? Introspecção de novo por causa do quê?

Se continuar insistindo, vai cair naquela: "chegou a chata"... Se persistir, vão até perder a contemplação: "bora, que a Polly chegou"... Essas coisas emocionam só por um período. E vai, pensa bem, ninguém que passou na sua vida até hoje valeu tanto. O baque foi cair de tão alto, né? Caiu das alturas. Muitas vezes. Se culpou, o que é pior. Tenta pensar que por causa de mentiras que tanto vc abomina, vc nào precisa necessariamente jogar tanta merda no ventilador... não dá pra somente ficar com as melhores fases? E ficando com as melhores fases, permanecer assim, no alto? Uma coisa feia não pode derrotar o encanto, Polly. Vc é a primeira que diz isso, nas suas teorias malemolengas.

E porque odeia tanto a mentira assim? Nunca mentiu, não? Mentiras ocasionais, necessárias, conserto provisório, estepe... Nunca? Essa de relacionamento aberto, leal, franco, sincero, é bonito no papel, na teoria revolucionária, na discussão de teses, nos debates de gente dita avançada. No dia-a-dia, cotidiano suado, onde temos que nos inventar e nos reinventar , lutar contra "o nada acontece" e a "rotina", a situação é bem diferente, Polly.

Sim, você apanhou da mentira várias vezes e isso é horrível, desmonta. Passou a lutar contra a falsidade das pessoas e do homem que amava, ou que dizia amar, todavia deixou outras mentiras desencadearem sobre a tua cabeça, tontona. Se suporta a fraude que é o mundo, se aceita o embuste e a mistificação para sobreviver (isso vc deixa claro) pq não fez isso com todos os outros também?

Se quer um conselho, esqueça tanto texto, mulher. Se ainda é a Pollyanna que conheço, dedicada e incapaz de sacanagem, jogue tudo fora. Não seria injusto com vc. Sua dor não é única, nem a maior. Quantas vezes vc excluiu de sua vida sem anestesia? Não adianta ficar querendo entender o desamor. Essas histórias ficam bem em novela, em cores, no horário nobre. Daria lágrimas aos olhos mais sensíveis. Vc, o ser mais desgraçado do mundo, por desesperadamente querer se apaixonar. Não quer dois, três, quatro. Quer só um. Para a mulher, o amor acontecer duplamente representa confusão, dilaceramento, tragédia interna (tá se reconhecendo bem nas palavras, né?).

Consigo até imaginar: Polly, com uma salada e um champanhe (que mistura estapafúrdia), envolvida em seus pensamentos, que passam em flashes p&b, para o público entender melhor, fará as pessoas soluçarem de emoção. O mundo dela ruiu, os lábios estão entreabertos, atônitos.... atacada de autopiedade. E pra finalizar a cena, joga a taça de champanhe na parede ... uma mistura de humor e loucura.

Cenas do próximo capítulo.

Hoje, dá pra se divertir com seu sofrimento, Polly. Adianta falar daquele que já sofreu assim por vc, que quis lutar junto e vc deixou ele ir embora? Quer um flagrante... vou te lembrar:

- O que você faria em meu lugar?
- Acho que só tem uma atitude a tomar...
- Qual?
- Você ir. Eu não vou.

Lembra? ele chorou, enquanto vc fumava um cigarro, no canto do sofá. Vou te lembrar também a última frase dele: - "Tô de camarote, assistindo a tua vida, e te esperando; porque só ela vai poder mostrar agora o quanto eu amo vc".

Há quanto tempo vc não viu mais ele? Por onde também, né? Só se vc carimbar o passaporte e ir lá, dizer aquilo que um dia não disse. Mas esse já foi. Só quis te lembrar que ele existiu. E eu sei, já que sou sua consciência, que têm mesmo uma redoma à sua volta. Com chaves. Redoma que impede das pessoas conseguirem enxergar aonde exatamente estão falhando contigo....

Vc quer levantar o ego, restabelecer confiança, se sente ameaçada, precisa de carinho, cuidado, conciliação, negociação, concessão. Como política. Sem rigidez. Quando vc mais precisa que te façam importante, e vc ali disposta a tudo, vai se tudo pelos vãos dos dedos. É como aquele beijo no cinema, quarta passada, que você ia recuar, mas cedeu outra vez. Bem na hora que o Murray abraça a loirinha bonitinha do filme de nome que lhe é bem peculiar... O beijo justo na hora do abraço. Vai ver, nem foi nessa hora, mas fica mais bonito aqui. E vc se sentiu a loira da telona. Se odiou.

O seu problema, em caixas altas, é: TRANFERÊNCIA DE RESPONSABILIDADE. Doeu? pois é! Considere o fato de estar se dizendo isso.

Pare de testar manobras, porque vc já está cansada de jogos, lógicas, raciocínios. Dará um imenso alívio. Mesmo no campo da solidão, que vc odeia tanto quanto o beijo de quarta passada. Noites vazias pra quê, garota? Fica na solidão mesmo, terreno que te curte, no qual vc navega à vontade. E tenha paciência. Vc não fala isso pra todo mundo? Então. Serve pra vc também, oras.

[/monólogo]