Daí que vi uns 3 ou 4 famosos atendendo as cartinhas. Pra quem não viu, funcionava assim: o famoso fazia uma gravação pra criança, dizendo que estava fazendo as vezes de Papai Noel (era até engraçadinho essa parte, as histórias que eles contavam: "Papai Noel machucou o dedão, e o pé não entra mais na bota... então, ele pediu pra mim...". Cada um inventava do seu jeito.).
Tudo muito lindo, já diria Caetano, até eu ver o presente do Rogério Seni (Ceni? sei lá...aquele goleiro). Um carrinho de boneca que, juro, deve custar uns dez contos. E uma bonequinha que não deve passar disso também. A menina, claro, ficou blaster feliz. Eu, uma pedra.
Logo depois apareceu Mariana Ximenez, dizendo que foi ao shopping e o Papai Noel tinha pedido um favor pra ela: atender aquela cartinha especial, onde a menina pedia uma boneca e uma cesta básica. Daí aparece A CESTA que a Mariana mandou, que tinha até sucrilhos; e a boneca: uma Miracle, que nos tempos da vaca gorda dei uma pra Rafa também. Ela parece bebê de verdade mesmo, é feita de uma textura muito equivalente à da nossa pele, tem peso de bebê de verdade, solta uns grunhidos, faz 'xixi' de ter que trocar fraldinha de verdade, mama de verdade (um mecanismo que a faz sugar a água e depois ela sai no xixi), pisca, sorri, uma graça. Custa uns 300 reais. E achei maravilhoso.
Comparavelmente ao goleiro narigudo, me enfezei e mudei de canal. Nem vi os outros. Melhor fechar com o gesto carinhoso da Ximenez do que ver outro global dando presentinho de 1,99. Enfim. Acredito que se é pra fazer um negócio, faça bem feito, oras bolas. Ainda mais tendo a conta bancária que tem.
Nem me interessa se ele ajuda mais lugares, nem se ele já distribuiu zilhões de presentes por aí. Não interessa também se a menina ficou feliz com a bonequinha ralézinha que ganhou. Acho que ela merecia o equivalente ao que ele poderia dar - e não fez.
Isso me lembra uma vez que eu vi na própria Globo, no Globo Repórter, há algum tempo já, o especial Fome, matéria que alertava sobre a fome no Brasil, e as áreas mais caóticas. E então um repórter vai entrevistar uma senhorinha, num barraquinho de chão batido, não lembro mais qual parte do Brasil, e ela estava a 4 dias sem comer. A mulher mal tinha forças pra falar, e o repórter lá, muito provavelmente cheirando a Giorgio Armani, perguntava qual foi a última coisa que ela havia comido.
Terminada a matéria com ela, enquanto aparecia cenas do lugar precário onde ela morava e uma panela preta, muito velha, em cima do fogão de lenha, surge só a voz do repórter dizendo que aquela senhorinha havia falecido 2 dias após a entrevista.
Fiquei com isso na cabeça durante dias e dias. E na verdade, isso ainda permanece em mim. Onde está o altruísmo? Como anda o altruísmo das pessoas? E, que porra, o repórter faz a matéria com uma senhora que não come a 4 dias, vai embora pra casa e consegue dormir sem ter feito nada? Não só ele, mas como toda a equipe... como é que ninguém levou aquela senhora ao médico, ou comprou comida pra ela? Como assim ninguém fez nada?
E eu, uma pedra - de novo.
Natal já foi muita coisa pra mim. Agora, com a morte da vovó, ele é apenas mais um dia que, inevitavelmente, tem que acontecer. Não montei árvore, não coloquei enfeite na porta, não há nenhuma luzinha piscando, a não ser meu próprio coração pulsando -e já meio cansado- por dias melhores, independente de dias em vermelho no calendário.
Esse Natal, especialmente, será o dia que agradecerei por ter sobrevivido, por ter os amigos que tenho (que no final sobraram bem poucos, mas insubstituíveis) e por ter duas filhas maravilhosas. E pedir pro Dono da Festa que passe tudo muito rápido e, se possível, de forma indolor.
Pra você que leu até aqui, desejo o que você quer.
E um Bom Natal.