17 junho, 2005

Uma vez, no alto de meus 20 e tantos anos, trabalhei em um escritório até bacana de se trabalhar, eu gostava. Lidávamos com vários gerentes comerciais, e isso era bom e ruim. Bom porque esse contato é bacana, estreita as decisões, tornando-as mais fáceis. E ruim, porque vários desses gerentes eram mauricinhos-babacas-enrustidos. Um deles se destacava. Era arrogante, prepotente, mas absurdamente bonito. Então tinha lá suas compensações em atendê-lo.

Uma vez, praticamente discutimos. Ele lá com as razões dele, eu cá com as minhas razões e ambos sem dar o braço a torcer. Na mesma semana, fui excluída do serviço para a empresa onde ele gerenciava, sendo trocada por um outro funcionário do mesmo escritório, que foi quem me contou a história toda do caboclo: recém-promovido à gerência, ele era o causador de várias intrigas por causa da prepotência, não de dando conta da onde tinha vindo e da onde tinha chego. Era um vendedor de móveis assalariado, que com alguma ambição e sorte, chegou onde chegou: a gerência cobiçada por muitos, de uma grande empresa aqui do Vale.

Claro que fiquei possessa com a troca estapafúrdia e com tudo que fiquei sabendo que ele falou de mim, mas ainda agia por trás dos panos, porque tinha entendimento no ramo que o colega que assumiu não tinha, e acabava sempre pedindo para que eu concluísse os relatórios, se dignando a só assiná-los. Em suma: eu continuei fazendo o mesmo trabalho, sem o gerente-cabeção saber disso.

Um dia, chegou um outro gerente, esse muito mais maleável, no lugar do moço bonitão. Assumi de novo o posto, intrigada com o sumiço. Muito cautelosamente me contaram que o ex-gerente-vendedor-sem-nenhuma-humildade havia sido despedido por justa causa: havia 'rodado' uma certa quantia no caixa, que ele não conseguia mais repor. Com a auditoria mensal, foi descoberto o roubo, e junto dele foram pra rua mais umas cinco ou seis pessoas...

Até aí, morreu a neusa. Vejo disso direto e reto. Só que a vingança é um prato que se come frio, dizem. E dou toda razão, porque anos depois, precisei comprar um outro armário de cozinha. Fui com a minha mãe em uma dessas lojas-povão e quem encontro lá? Pois é, fiz que nem vi. Escolhi o jogo de armários, fiz as combinações que eu queria, o vendedor já estava fechando a nota, quando escuto meu nome. Viro-me e o talzinho tá lá, todo sorridente, ao meu lado: continuava bonito.

Passei os olhos pelo crachá, onde tinia a palavrinha "Vendedor". Sorri de volta pra ele, disse um "Como vai" e ele, tão desmemoriado, falou: "Pôxa, uma bela aquisição você fez. Porque não comprou comigo?". Ah, mas nem a mais santa das madres deixaria passar essa... Com o cynicism ligado, soltei:

- Eu vi que você voltou para o lugar da onde nunca devia ter saído, mas fiquei com medo de você superfaturar a nota.

Ele fechou a cara na hora, virou nos calcanhares e sumiu pros fundos da loja. Minha mãe, que além de ser o que é, ainda por cima não sabia de nada, defendeu o moço. O vendedor que me atendia arregalou uns olhos assim. E eu resolvi trocar por outro armário, mais caro, só de pirraça.