03 junho, 2005

Chamemos-na de Miss Moon. Somente para ela ter um nome. Como se um nome apenas bastasse à ela, um-hum. Pois bem.

Ela tinha acabado de sentir o gosto fantástico e doce da liberdade em sua pequena boca. E foi simples: um dia Miss Moon saiu para trabalhar e quando voltou estava tudo onde deixara. Inclusive aquele papel velho que ela achou dentro da bolsa; uma lista de supermercado de dois meses atrás, amassadinho exatamente onde ela deixou.

"Livre". Foi tudo que ela pensou, logo após o suspiro e o sorriso de canto.

Os convites começariam a aparecer e ela estava disposta a atender e cumprir rigorosamente com todos eles. E realmente cumpria-os. Com toda a vontade do mundo, sentou em cada barzinho elegante da cidade e em cada muquifo que nunca imaginara um dia entrar.

Foi quando veio o inevitável: a viagem com os amigos. E dentre esses, um amigo um pouco diferente, aquele mais especial, aquele que acalmava seus ânimos e hormônios de vez em quando, se é que me entende.

Miss Moon estava toda empolgada. Se encarregou de todos os detalhes: da hospedagem à divisão de custos. Iam todos em um mesmo carro, no dela. E ao lado, que preferiu ir [excepcionalmente] dirigindo dessa vez, foi o tal amigo mais chegado, o companheiro de sempre. Junto do casal, haviam mais dois homens e mais uma mulher. Noves fora, alguém ia sair despriviligiado, mas estavam indo para a praia, um lugar de muitas possibilidades.

A casa que alugaram era perfeita. Como eram poucas pessoas, um quarto só serviam-os muito bem. Quem quisesse privacidade, que se arrumasse na sala. Ou na rede: na varanda haviam uma meia-dúzia delas. Tudo maravilhosamente bem, Miss Moon pensou. E o beijo do amigo havia melhorado ou era a maresia que fazia bem à ele?

...

Na primeira noite, a noite do dia em que chegaram, eles saíram, os cinco, para jantar. Muitas conversas e drinques depois, Miss Moon foi a única que não bebeu tanto assim - acreditava que no estado de sobriedade se aproveitava mais as coisas. Só que o amigo-companheiro não pensava da mesma forma e saíra completamente dos eixos. Sentado na beira da praia, quase de madrugada, ele colocou a alma dele toda pra fora em forma de excreções difíceis de registrar....

Miss Moon se preocupou e ganhou um "me deixa sozinho" como agradecimento. O pedido foi tão seco , que ela obedeceu prontamente. Sentou-se no calçadão sozinha, pensando no descabimento do acontecido. E um amigo, desses que viajou com ela no mesmo carro, lhe fez companhia. Aí, Miss notou que não foi só ela que não se embebedou. A princípio, o assunto era o nauseado da areia. Mas a conversa começou a fluir de uma forma tão envolvente, que ela chegou a questionar o porquê eles nunca tinham conversado com tão afinco.

E se sentiu deliberadamente atraída. Não, esse amigo nunca foi tão amigo assim. Se conheciam somente. Se conheciam a ponto dela levá-lo na viagem, sem espantos. Mas ele era incrível. E ela se envolveu em cada história que escutou dele. As horas passavam e eles nem notaram que o grupo de amigos já tinham ido embora. Todos eles, inclusive o ex-amigo-companheiro-bêbado-mal-educado dela. Ex sim, porque ninguém em sã consciência falaria aquilo, principalmente em um momento tão dedicado dela com ele.

Aquela noite, a primeira ali na praia, ela se segurou. Por mais que tenha tido todas as vontades, vontades pertinentes, ela se segurou. Tinha lá seus princípios. Voltaram para casa, mergulhados em uma conversa cada vez mais agradável e infinita. Juntou toda a coragem e toda a resistência e dormiu só. E sonhou com a mais nova atração. E gostou do que sonhou.

Ao acordar, Miss Moon teve uma surpresa. Aliás, várias durante o dia todo. O amigo que fizera companhia na praia o resto da noite anterior, estava ao teu lado, mexendo em seus cabelos. Beijou-a no rosto e disse ter se esquecido de uma coisa importante. Quando questionado do quê seria, ele completou que havia sido um prazer a tal conversa. Miss Moon esquecera de todo seu mau-humor matinal. Sorriu de volta ao amigo. Foi um prazer também pra ela.

E ao encontrar com a carcaça-humana-ressaquido da praia, trocou um Bom Dia seco, sem mais churumelas. Ela já havia caído em outro encanto. Era tarde. O encanto do cavalheirismo, da educação, da simpatia. Onde estava esse moço antes, perguntava-se Miss Moon. Mas alguma coisa a fazia resistir ainda. Não que algo os impedisse. A atração era certa. A vontade era de ambos, visivelmente. Mas a hora certa estava próxima, ela sentia.

E finalmente chegou. Isolados no quarto, ainda sem toques, mas com alguma insinuação mais calorosa, ela sente sede e sai buscar água na cozinha, onde todos os outros estão. A cena vista por Miss Moon destrancou todas as portas rumo à boca do amigo irresistivelmente atraente: o ex desbravava escandalosamente os mistérios da outra amiga, em um ato heróico e deslumbrante. Assustado com a presença de Miss Moon, ele travara. Mas ela sorriu. Sorriu abertamente. Era o que ela precisava. A hora certa.

Miss esqueceu-se até da água. Voltou pro quarto e entregou-se por inteira. Pelos outros três dias seguidos também. E por mais alguns meses depois, claro. E foi ele quem voltou da viagem ao lado dela dessa vez no carro, afagando-a nos cabelos e sorrindo, felizes - enquanto o ex nem tão bêbado mais dormia no banco de trás, junto dos outros dois caladíssimps. Soube depois que o beijo do ex-companheiro havia sido um ímpeto de ciúmes. Ora, ora. Ela estava mesmo com a bola toda.



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[o dia de ontem não devia, definitivamente, ter acontecido]

[passei mal o dia todo e nem trabalhei à tarde - na verdade, não trabalhei nem pela manhã]

[e por razões que a própria razão desconhece, até minha mãe baixou em casa, feito um tsunami, só pra dar "uma passadinha" e ficou até à noitão]

[porque desgraça pouca é bobagem]

[daí tem que ficar aguentando o falatório dela que ela não consegue fazer em menos de 385672348725738745150 decibéis]

[então decidi que eu não ia brigar com ninguém, que ia só ficar quieta, com a almofada na cabeça, morrendo de dor estômago]

[e tomar os chás da minha mãe que se engalfinhava na cozinha com a Anita pra fazer, coitada]

[e aguentar minha mãe aos berros para contar uma simples história - dos outros]

[e aguentar histórias minhas de milnovecentosebolinha que eu nem me lembrava mais]

[e ainda por cima, vê-la abrindo minhas gavetas, armários, lendo papéis, extratos]

[porque a sua mãe deve ser excelente, mas a minha não é]

[que dia horrível o de ontem]

[e pra compensar ontem que eu não tive sossego, hoje eu também não fui trabalhar]

[porque ainda estou com resquícios de dor]

[sabe quando vc sente muita dor e depois que passa a dor maior, fica aquela sensação estranha? então, essa]

[mas acho que se minha mãe aparecer hoje, eu não atendo a porta]

[porque a minha mãe é boa lá, na casa dela, com as coisas dela, bemmmm longe]

[e porque quando estou mal de saúde, quem menos quero por perto é a minha mãe]

[e pra ser bem sincera mesmo, quando estou bem também]

[porque a minha mãe não é como a sua mãe]

[e eu, provavelmente, não seja como você]

[mas hoje vai ser um dia melhor...]

[sem o tsunami de minha mãe por perto, se não for pedir muito, claro]

[tá então]

[grata]